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A língua está em mim, me perpassa, faz parte da minha formação como ser social inserido num grupo. Compõe ainda a minha própria formação acadêmica já que resolvi após o primeiro curso superior (Administração), cursar Letras. Essa língua me representa em todos meus conflitos, pois suas características são iguais as minhas, um ser multifacetado, de exterior sóbrio e estático, mas no íntimo um turbilhão em movimento. Assim como um rio congelado que apresenta a sua superfície estática, mas o seu interior está sempre em movimento, num curso perene. Capacidade de adaptação e compreensão com singularidade e regionalidades tolerantes como próprios à língua. Escrever é para mim, como respirar, sinto essa necessidade e é através da escrita como afirmou Aristóteles que transitamos desde o terror até a piedade de nós mesmos e do outro. Esse ofício da escrita nos eleva, nos projeta, nos ressignifica quando tocamos o outro com as nossas palavras, seja no universo ficcional, biográfico ou autobiográfico. Escrever é uma necessidade, escrever é transpirar no papel as nossas leituras.

sábado, 5 de dezembro de 2015

A GRAMÁTICA E A ESCOLA.



 






     Segundo Azeredo (2000), em seu sentido mais técnico, no âmbito da ciência da linguagem, gramática é o termo que designa a representação da faculdade da linguagem: a faculdade mental que distingue a espécie humana das demais espécies animais. Essa faculdade mental que se manifesta através da fala, apresenta certas características tais como: permite aos seres humanos organizar e expressar os seus pensamentos em frases. Tal faculdade é transmitida na herança genética da espécie humana e ativada a partir do estímulo de dados linguísticos que a criança aprende da fala dos adultos,(interação).
      Desse modo todos os seres humanos possuem esse sistema mental que permite ao indivíduo se tornar falante de uma língua natural, portanto, toda frase produzida por um falante nativo de uma língua humana, em situações normais de comunicação oral e escrita, é gerada a partir de um sistema de regras extremamente complexo e articulado, mesmo que essa frase seja considerada "errada"  de acordo co  o padrão normativo/prescritivo vigente, definido pela tradição gramatical.
      Há ainda vários sentidos do termo gramática, para além de designar a faculdade da linguagem, o temo gramática é utilizado com o sentido de qualquer descrição do sistema de funcionamento de uma língua.(princípios e parâmetros que regem as línguas e as diferenciam), e ainda com o sentido referente ao livro que apresenta essa descrição. A tradição gramatical apresenta algumas características como restringir-se apenas uma variedade da língua fixada pela tradição literária, dita padrão; indicar essa variedade como modelo para o uso da língua.
      Assim as gramáticas tradicionais usadas no ensino da língua assumem um duplo papel descritivo e prescritivo. E ainda por buscarem normatizar o uso linguístico, essas gramáticas são também chamadas de normativas.
      O léxico e a sintaxe são partes constituintes da nossa faculdade da linguagem e estes módulos são formados respectivamente por palavras lexicais e gramaticais.
      As palavras lexicais constituem um conjunto aberto, isto é, a qualquer momento um novo verbo, substantivo ou adjetivo pode ser criado em função de objetos atitudes ou conceitos novos que vão surgindo na vida social. As palavras referenciais,(lexicais) têm ainda uma maior facilidade em sofrer modificações ao longo do tempo, de acordo com a necessidade de uso dos falantes.
      As palavras gramaticais, por sua vez, constituem um inventário fechado, pois dificilmente passam por mudanças, logo a criação de um novo item é muito mais difícil.
      Desse modo pode-se fazer a distinção entre palavras lexicais cuja significação remete ao mundo real,  e as palavras gramaticais , cuja significação situa-se no plano do processo linguístico de constituição do enunciado, a sintaxe.
      Vejamos algumas aplicações: frase gramatical sem correção gramatical; ex: "Nós vai viajar amanhã." É uma frase gramatical, visto que os falantes da Língua Portuguesa,(Português Europeu ou Brasileiro), aceitam-na e qualquer um deles pode utilizá-la. Há uma argumento externo, uma locução verbal, seguido de um adjunto adverbial,(de tempo), assim como determina a língua.
       Dessa forma entende-se que  gramaticalidade é um termo distinto de correção gramatical, posto que esta se resume em um conjunto de regras de uma determinada norma, é algo mecânico. A gramaticalidade faz parte do nosso módulo linguístico, enquanto que a correção gramatical  é somente uma questão estética exigida pelos normativistas mas não necessárias à existência da faculdade da linguagem do indivíduo.
        Frase gramatical sem inteligibilidade; " Voltaram aqueles que não saíram." É uma frase gramatical, pois é formada de acordo com o sistema gramatical de uma língua particular- a Língua Portuguesa. Mas sem inteligibilidade, pois como pode voltar/retornar aqueles que não foram, não saíram? A frase apresenta-se sem compreensão.
        Frase gramatical sem aceitabilidade;  ex: Paulo gosta que João pense que Tércio ache que Mara trai Jonas que finge não saber que o vizinho comenta que Caio encoberta essa desfaçatez.
       Gramatical ambígua; ex: "Dei carona a Mário quando estava atrasado." Agramatical mas decodificável; ex: " Noite muito bonita ser." A atividade linguística opera em três planos: linguístico- construção de frases, cognitivo- estruturação de frases em textos, pragmático- o contexto em que essas frases/textos estão inseridos- linguística do discurso.
       O módulo linguístico remete à própria faculdade da linguagem, ou seja, à capacidade que o ser humano  possui de expressar os seus pensamentos em frases. Nesse sentido, todo indivíduo é um falante pleno, no interior do seu universo cultural.
       Em relação ao módulo linguístico da comunicação verbal, a tarefa da escola seria ampliar o repertório linguístico, introduzindo-o sobretudo na variedade linguística utilizada no universo institucional e da produção e transmissão do saber formalizado, já que ao chegar a escola, a variedade linguística que o aluno domina é a linguagem familiar, do senso comum, o saber intuitivo que permeia o nosso cotidiano.
       Por outro lado, a escola deve desenvolver ainda, a consciência do aluno para a diversidade linguística combatendo a discriminação das formas não padrão do uso da língua.



     





     

sábado, 3 de outubro de 2015

DO ORIENTALISMO



                  A crise da representação na literatura brasileira contemporânea, está relacionada à figura do narrador ou da tríade autor-narrador-personagem.
                  Como afirma Regina Dalcastagnè (2008) o ser humano tem a necessidade de ser representado, o problema dessa representação é a questão da voz. Falar para quem? E em nome de quem? Quando se fala no "outro" não se fala dele como ele realmente é, falamos de um ponto de vista, falamos da forma que queremos vê-lo.
                   A partir do momento que o outro é visto dessa forma legitima-se a distância social que existe entre o narrador e o personagem, (o outro). Esse outro na maioria das vezes é visto de forma preconceituosa, pois as características que o narrador encontra nele, (o outro) são contrárias às suas, (narrador) para manter uma distância entre eles.
                    Esse outro é  a massa consumista, pobre, que ainda não possui uma identidade e faz parte de um cenário urbano. Em relato de certo Oriente, Hatoum, (debruça-se sobre um tema bastante comum:  a família e seus dramas, o texto de Hatoum mostra que o refúgio da memória é a interioridade do indivíduo, reduzido e isolado na sua própria história, incomunicável com outro mundo que não  seja o dele.) As separações que a aristocracia que detinha o poder operou a fim de que o "poder" não fosse democratizado, como trata Cancline no seu texto: Os desajustes entre o modernismo e a modernização são úteis às classes dominantes para preservar sua hegemonia, e às vezes não ter que se preocupar em justificá-las, para ser simplesmente classes dominantes. Na cultura escrita, o conseguiram limitando a escolarização e o consumo de livros e revistas. Na cultura visual, através de três operações que fizeram possível às elites reestabelecer repetidamente, na frente de cada câmbio modernizador, sua concepção aristrocratica; espiritualizar a produção cultural sob o aspecto de “criação” artística, com a consequente divisão entre arte e artesanato;  Congelar a circulação dos bens simbólicos em coleções, concentrando-os em museus, palácios e outros centros exclusivos; propor como única forma legítima de consumo de estes bens, a modalidade também espiritualizada, hierática, de recepção que consiste em contemplar. (CANCLINI, 1997, p. 67.
                    O texto de Hatoum se estrutura através de uma estratégia de composição que transita e oscila entre a narração - em que a figura do narrador é extremamente importante e o relato é feito principalmente com base nas tradições orais, como uma tentativa de rememoração das experiências coletivas do passado e o romance que apareceria como um gênero literário decorrente das transformações da sociedade capitalista que destrói cada vez essas tradições.
                    Relato de um certo Oriente é formado por um conjunto de vozes, organizado por uma narradora que retorna a Manaus depois de muitos anos ausente. Essa mulher sem nome procura por Émile, a matriarca de origem Árabe que criou a ela e a seu irmão. O texto é uma extensa carta destinada ao irmão que continua distante de Manaus. Após sua estadia numa clínica, a narradora decide retornar para sua terra natal, e termina por desencadear um despertar múltiplo de memórias, que se estenderam de Manaus até o Líbano.
                    Sobre essa tentativa de narrar sua própria história e as características desse fazer narrativo, Hoisel,(2006) irá afirmar que a concepção gerada pela crítica positivista do Século XIX, passou a valorizar a biografia do ponto de vista que o texto era produto do autor, ou seja, o autor possuía autoridade sobre o seu próprio texto. Hoisel afirma ainda, que o conceito de biografia nem sempre existiu, muitos autores foram criando, de forma que era uma parte da historiografia como um gênero literário, (Como a narradora de Hatoum, se apóia na sua história e nos relatos de outros a respeito de si mesmo para compor a sua autobiografia endereçada a seu irmão.)
                     É a partir do renascimento que surgem as condições históricas efetivas para que a biografia e a autobiografia possam se afirmar como forma discursiva, que se constituirá pela presença do sujeito a partir de um duplo e simultâneo foco: Como o sujeito reage ao mundo e como o mundo reage ao sujeito. Hoisel afirma que na Idade Média faltava essa inter-relação, uma vez que, nesse período, o sujeito ainda não é pensado a partir de suas dimensões psicológicas.
                      Desse modo, Hoisel elenca Rousseau como responsável pelo traços que constituem a autobiografia moderna, o que Costa Lima vai considerar como paradigma da autobiografia moderna, destacando cinco características principais desse gênero: definição da autobiografia como documento de uma vida, narrado por um narrador competente, prazer que o sujeito encontra em se narrar, revelação da sua própria intimidade e a paixão indagadora,(podemos perceber todas essas características no testo de Hatoum, apesar desse texto ser composto de um mosaico de citações- narrativas).
                       Diante disso Hoisel defende que apesar determinados aspectos da biografia já existirem dentro de outros textos, somente Rousseau irá determinar definições mais claras, como a questão do pacto do sujeito com  linguagem. Esse pacto consiste em registrar com veracidade a sua própria vida,(O que pretende a narradora de Hatoum, ao organizar um conjunto de vozes na sua narrativa), desse modo a biografia teria características como: autenticidade, veracidade, exemplariedade, legitimidade. Mais tarde Rousseau irá constatar que na Modernidade, não é possível dizer tudo através da obra autobiográfica, devido a dificuldade que está relacionada à linguagem.
                        Hoisel ressalta que os estudos psicanalíticos  abalam a concepção de literatura,(biografia/autobiografia) no Século XIX, por questionar o poder e o querer autoral, criticando assim, o nascimento do texto, de forma que o autor que o produz trás consigo todas as interpretações "corretas".Hoisel conclui sobre a questão biográfica, que já temos a realidade tal qual ela é; uma produção da linguagem. E interpretar essa realidade só é possível através de um olhar que codifica ou decodifica através da linguagem, levando em consideração o seu contexto histórico, cultural,(conhecimento e experiências passadas), segundo a sua percepção individual.
                        Logo a biografia não é apenas a reprodução do que foi vivido factualmente. A obra é uma vivência imaginária que percorre várias territorialidades onde o autor esteve físico e emocionalmente envolvido, e que resultou em experiências múltiplas. Vale ressaltar ainda as relações do texto de Hatoum e Said,(2003) que objetiva demonstrar como se constitui toda uma área de conhecimento, o Orientalismo, dedicada a reforçar procedimentos de domesticação e naturalização do mundo do outro, o Oriente.
                         Em seu texto Said não percorre essas questões que ainda não apresentavam, naquela época, essa configuração alarmante. Mas as relações se estabelecem naturalmente, e após uma leitura atenta do texto de Said a conjuntura contemporânea se apresenta paradoxalmente, mais compreensível e incontornável, pois são séculos de continuado desrespeito e dominação: O imperialismo orientalista pressupõe: " uma raça submetida, dominados por uma raça que os conhece e sabe o que é bom para eles, melhor do que eles poderiam jamais saber por si mesmos, (a questão da representação do individuo pelo intelectual e sua função social- falar pelo outro). "A realidade orientalista é tão desumana como persistente".
                          Da mesma maneira que Hatoum em seu relato, demonstra a  mesma questão por um viés mais doméstico.

HOISEL Evelina- Grande Sertão Veredas- Uma escrita biográfica. Salvador: Assembléia Legislativa Do Estado da Bahia. Academia De Letras da Bahia, 2006.
HATOUM Milton. Relato de um certo Oriente: Companhia  das Letras 1989.

SAID. Edward W.  Orientalismo:
O Oriente como invenção do Ocidente. Trad. Tomás Rosa Bueno. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
Regina Dalcastagnè (Org.). Ver e imaginar o outro. São Paulo: Ed. Horizonte, 2008.
CANCLINI Nestor G. Culturas Híbridas, São Paulo, Ed. USP, 1997.


segunda-feira, 29 de junho de 2015

Humanitatis





             


                  Gosto das minha rugas, faz-me saber que estou vivo. Que sinto  que amo que sofro  que corro que morro que grito!
                  Gosto da minha tristeza. Faz-me perceber que penso que calo que ajo que luto que envelheço que perco e me perco e me acho e me  vejo dentro de sorrisos que minhas rugas revelam...

domingo, 29 de março de 2015

Vícios.





                    Levanto cedo. Vejo o mundo por signos. Trabalho, corro, canto, amo. Me iludo, me iludo, me iludo... Ouço fantasias, sonho realidades, cicatrizo sentimentos.
                        Vivo conceitos, busco auxílio, perco soluções. O real me rejeita, o ideal me aceita, o tempo me aproveita. Sofro singular e anônimo. Corro na contramão do relacionamento.
                          Cem companheiros, nenhuma companhia. Sempre solitário, dia a dia. Não me iludo com a realidade, sou enganado mesmo, pelos sonhos.