Quem sou eu

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Salvador, Bahia, Brazil
A língua está em mim, me perpassa, faz parte da minha formação como ser social inserido num grupo. Compõe ainda a minha própria formação acadêmica já que resolvi após o primeiro curso superior (Administração), cursar Letras. Essa língua me representa em todos meus conflitos, pois suas características são iguais as minhas, um ser multifacetado, de exterior sóbrio e estático, mas no íntimo um turbilhão em movimento. Assim como um rio congelado que apresenta a sua superfície estática, mas o seu interior está sempre em movimento, num curso perene. Capacidade de adaptação e compreensão com singularidade e regionalidades tolerantes como próprios à língua. Escrever é para mim, como respirar, sinto essa necessidade e é através da escrita como afirmou Aristóteles que transitamos desde o terror até a piedade de nós mesmos e do outro. Esse ofício da escrita nos eleva, nos projeta, nos ressignifica quando tocamos o outro com as nossas palavras, seja no universo ficcional, biográfico ou autobiográfico. Escrever é uma necessidade, escrever é transpirar no papel as nossas leituras.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

FRUSTAÇÃO



Cansei de esperar, cansei de relegar,  cansei de superar.
Cansei de dizer, cansei de querer; cansei de amar você.
Cansei do desprezo, cansei do desvelo, cansei do desapego. Cansei de sonhar, cansei de acordar, não quero voltar.
Olhar o passado, encarar o presente vê o futuro. Não estou completo, tudo é incerto. Me sinto obtuso. Impossível amar, mudar, acreditar. Expurgado da vida, depositado no ostracismo, sobrevivo à rejeição, o estigma da frustração, revestido de insatisfação.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

SAMUEL RAWET / MOACYR SCLIAR





ANÁLISE DO CONTO ESCALPE DE MOACYR SCLIAR.

Análise comparativa entre os escritores Samuel Rawet e Moacyr Scliar convergem nas obras autoficcionais em que as fronteiras racionais entre vide e obra, se mesclam, compondo um híbrido de ser real e ser imaginado.
Podemos perceber na escrita destes autores a figura do judaísmo e dos judeus que as obras evocam. Essa imagem é formada em duas instâncias diferentes: a voz narrativa pode se identificar como judaica, o que acontece muitas vezes em textos autobiográficos ou autoficcionais, ou essa voz pode criar personagens e atmosferas judaicas nas quais transpire uma visão específica sobre o judaísmo.
Nenhuma das escritas estudadas projeta  exclusivamente uma imagem de judeu clichê, seja tal clichê o construído pela comunidade judaica ou o construído pelo grupo maior. Sendo a voz em primeira ou terceira pessoa, as obras analisadas revelaram diferentes graus de tradução, graus esses indefiníveis, pois fora de uma escala precisa. Vemos judeus desscritos que autofagicamente criam, a partir da representação tradicional do judaísmo, diversas maneiras de ser judeu. Suas escritas demonstram o poder da palavra na projeção de um imaginário de uma cultura que está em trânsito. Para uns, esse trânsito é prejudicial e corrosivo, empobrecedor; para outros, essa ausência de imobilidade é que permite a sobrevivência de um legado em suas diversas traduções. Assim, a escrita foi vista como lugar de livre ação, mas também de inscrição da tradição, da memoria, das quais não se escapa; as historias de um grupo têm uma memória que se perpetua em novas historias.
Em Samuel Rawet, entre o fascínio e o enfado, sua obra projeta a imagem do escritor experimentalista, avesso as questões do consumo, livre de amarras e imposições mercadológicas, disposto a uma escrita que gira em torno de si mesma de maneira alucinante.
Samuel Rawet cria o escritor Samuel Rawet como um artista abusado, corajoso, disposto a encarar a escrita como uma aventura muito séria. Seu manejar labiríntico da língua e sua erudição convivem com o seu sarcasmo, o primeiro dos vários atritos que marcam sua obra.
Com relação ao judaísmo, o autor também se coloca como aquele que se permite o direito de experimentar, independentemente do preço que venha a pagar — no seu caso, um anonimato persistente, que se desfaz atualmente com lentidão, ainda atrelado a grupos de estudos judaicos, e uma perplexidade por parte desse grupo que ele rejeita e ataca com ferocidade. Evidentemente, experimentar talvez seja um eufemismo meu. Contudo, gostaria de marcar que a rejeição progressiva de Rawet aos judeus, ao meu ver, se coloca também como instrumento da escrita, e passo fundamental para a quebra de limites que ele se propõe. O Rawet judeu criado por Rawet é aquele que vive em conflito com a família e a tradição, mas, principalmente, é aquele que rejeita convenções, sejam elas judaicas ou literárias.
Se podemos argumentar que isso se deve a um suposto auto ódio do imigrante que deseja ser um Brasileiro, podemos, da mesma forma, alinhar sua postura como a de um constante desafiador de regras - papel que, como imagem, cai bem, na linha do artista e pensador livre; concretizado texto, todavia, nem sempre o resultado é sedutor.
Em consonância com suas oscilações e contradições, o personagem judeu da ficção de Rawet é, por excelência, o andarilho, o errante, o judeu diaspórico, o imigrante desenraizado em busca de referentes possíveis. Um personagem sofrido, mas também capaz de ser mesquinho - ser judeu, ter sido judeu,  significa ser honrado em particular. Em contraste, Moacyr Scliar é um escritor nascido em berço judaico, o qual fundamenta e produz material para sua literatura. Ser judeu e ser escritor são dois papéis em harmonia, interdependentes. Seja como contador de historias ou contador de si próprio. Scliar projeta uma imagem que é tão pacífica e de bem consigo que julgamos tê-lo decifrado rapidamente. Não há conflitos drásticos a serem expressos, e a escrita revela­-se fluente, acessível, prazerosa. O autor é talvez o que de mais próximo existe do contador de historias Benjaminiano, atuando corno o fio condutor de uma memoria milenar que é respeitada, mas criticada quando necessária. Para o autor, ser considerado um escritor judeu não é uma limitação, pelo contrario: o judaísmo é um dos elementos principais de sua prosa, e a tradução desse para o contexto brasileiro constitui a principal mola propulsora de sua escrita. Sem se ater a rótulos, Scliar é a interseção mais hem acabada entre a cultura judaica e a brasileira. O autor representa o cânone da literatura feita por judeus no Brasil, se assim podemos afirmar,  sua tradução acaba por se tornar, curiosamente, a versão oficial literária do encontro de identidades. Suas obras tornam o elemento estranho, estrangeiro mais próximo e desacralizado, acessível e agradável, o que as configuram como a dialética possível das diferenças e a absorção e ressignificação do choque inicial. Ressignificar a choque é desenvolver a tolerância, conteúdo subjacente de vários de seus livros.
Sobre o conto escolhido, Escalpe, de Moacyr Scliar, não há nada de singular (especial) no conto até o trecho da perseguição do engenheiro a jovem pela floresta, é como se o trecho inicial quisesse tirar a atenção do leitor para verdadeiro foco, quanto ao narrador (onisciente?), não temos certeza dessa onisciência pois, se confunde a fala dos personagens a do narrador, essa narração é feita em 3ª pessoa.
Trecho emblemático: “Ele cortou os cabelos enquanto ainda estava deitado sobre ela”: Ele a teria possuído?
“A peruca fora feita, meses se passaram, uma criança nasceu, um menino”. Associação à peruca ao nascimento da criança dessa mulher que forneceu seu cabelo para confecção dessa peruca (uma narrativa).
Inicio de outra narrativa: “Uma tarde de domingo, o engenheiro descansava em casa, lendo uma revista”. Estava sozinho, a esposa e os filhos passavam a dia fora.
A ambiguidade se estabelece por que o narrador afirma o nascimento de um menino ao tratar sabre à peruca e inicia outra narrativa falando da família do engenheiro e ao tratar das crianças do casal, usa o termo “filhos” e não filhas (se houvesse nascido outra menina da esposa do engenheiro), confirmando que o leitor é quem irá determinar a sua leitura a partir daquilo que lhe é pertinente acreditar (obra aberta).

Em homenagem ao grande escritor Moacyr Scliar que nos deixou no último ano (2012).

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

CONVÍVIO


O passado é meu algoz, professor e herói. Habito o presente, luto contra o tempo, não reconheço a velhice.
Amanheço verões, longa é minha espera; primaveras eternas.
Anelo compreensão, perdão, alguma emoção.
Abomino a razão, ignoro a satisfação, amo a solidão, amiga inseparável, indissociável, a única companhia constantemente inegável.

DESALENTO


Não obedeço às convenções, trilho desencontros, não estou satisfeito, não consigo amar direito.
Não aprecio o coletivo, destoo das tendências, não obedeço ao calendário.
Incongruente e assimétrico busco o método.
Constantemente relegado. Do amor expatriado, enganado pela razão cativo da ilusão, forasteiro da satisfação.
Não compreendo os sentimentos, só nos faz sem alento. Já não espero um grande acontecimento apenas sobrevivo o momento.