Quem sou eu

Minha foto
Salvador, Bahia, Brazil
A língua está em mim, me perpassa, faz parte da minha formação como ser social inserido num grupo. Compõe ainda a minha própria formação acadêmica já que resolvi após o primeiro curso superior (Administração), cursar Letras. Essa língua me representa em todos meus conflitos, pois suas características são iguais as minhas, um ser multifacetado, de exterior sóbrio e estático, mas no íntimo um turbilhão em movimento. Assim como um rio congelado que apresenta a sua superfície estática, mas o seu interior está sempre em movimento, num curso perene. Capacidade de adaptação e compreensão com singularidade e regionalidades tolerantes como próprios à língua. Escrever é para mim, como respirar, sinto essa necessidade e é através da escrita como afirmou Aristóteles que transitamos desde o terror até a piedade de nós mesmos e do outro. Esse ofício da escrita nos eleva, nos projeta, nos ressignifica quando tocamos o outro com as nossas palavras, seja no universo ficcional, biográfico ou autobiográfico. Escrever é uma necessidade, escrever é transpirar no papel as nossas leituras.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

MALÍCIA





                       A realidade machuca, a verdade desperta. O sentimento ilude, o amor confunde. As evidências enganam, o interesse mascara, o conhecer desanima. A frustração fortalece.
                       A solidão enobrece um desapontamento inerte. Uma companhia eterna. Cumplicidades, desejos e medos. A compreensão será sempre refém da razão. A paixão não mantém satisfação.

domingo, 27 de outubro de 2013

TRAVESSIA




                     Da minha vida fiz um caminho, uma ponte de emoções, entrelacei vários sentimentos, fiz o coração cidade abrigo. Refiz os perigos, angariei amigos não me achei nos desencontros perdidos.
                     Abracei o silêncio, amei a contento, relacionamentos emprestados, devassados, solidários. Fiz do escuro, claro e o escuso noticiei.
                      Emprestei meu sorriso abdicando do riso, dediquei a alma, a amar sem causa. Aplaquei a paixão, amadureci a razão, e só então, concebi a satisfação.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

MAGISTER





              Sou o início de tudo, sou a Hera das eras, sou o papel em branco, sou a significância do canto,
sou a completude do ser, sou o amálgama do saber. Gero, multiplico, desnudo, aperfeicôo, alimento instruo.
               Entôo cântico de conhecimento, levo ao mundo o meu alento. Forjo valores, ideais. Égide egrégio, crenças. Desmistifico a ciência.
               Preencho o interstício, sou o discurso político. Efemérides universal. Personalizo o conhecimento real.  

sábado, 12 de outubro de 2013

CLAUSURA







                     Houve um tempo em que me perdia. Perdia-me ao perder muito tempo, negando o  real,
 abraçando o desleal, fugindo da existência, imaginando transparências.
                      Vivia sufocado, enclausurado. Anestesiara o desejo, o medo, a razão. Mentia a realidade, vestia a impossibilidade. não aventava a satisfação, a plenitude da realização.
                      Comungar com o mesmo gênero, ser abjeto, obsceno. Suportar o descaso, o desprezo, preconceito. Caminhar contrário ao sentido direito, ser condicionado, epígono imperfeito.
                   
                 

terça-feira, 24 de setembro de 2013

ILUMINADO






           Assentei-me no silêncio das muitas buscas, me perdi.  Desencontros, encontros, caminhos transviados, encruzilhadas. Nada encontrei, não me achei, ainda mais perdido vaguei. Espiral de sentimentos, confusão de pensamentos, reticência conflituosa, me ausentei. Apaguei rastros, veredas
, fatos.
         Negativas, recusas, dores escusas... Desisti.


domingo, 4 de agosto de 2013

SOTURNIDADE







                Tenho pressa. Pressa de amar, de encontrar, de ser feliz. Pressa de obstinar, pressa de estabilizar  de concretizar.Turbilho emoções, desejos intensos.
                Perco facilmente, desapego difícil. Continuo apressado. Abrevio a sequência, viajo a última cena, anseio a conquista, e no final... Sofro antecipadamente, perco tudo de vista.

domingo, 21 de julho de 2013

MOMENTO.











                          Escrevo na angústia, a tristeza me insulta, a saudade me machuca, o sofrimento me resulta.
Estou só. Vazio, não entendo o desafio. Viver desacompanhado do amor, me relacionar com o favor, pulsar instabilidade, dor.
                           Futuro sem companhia, companheirismo ou fidelidade. Preso no invólucro estertor, anseio
por realização no amor. Sem razão, nego o adeus, anelo a satisfação.

domingo, 9 de junho de 2013

ESTAÇÕES.



                 Me sinto sozinho, vazio. A felicidade evaporou, me de deixou. Hospedou-se no vazio em mim.
Restaram-me fotos, lembranças, esperança. Não quero ocultar o desejo, sou companheiro do medo.
                  Amo-abraço-entristeço.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

CONFLITO





                     O sentimento me corrói, a saudade me destrói. A ilusão me alimenta, o desejo me acalenta. A realidade me perturba, a  sinceridade me machuca.
                      A ausência me tortura, a distância aumenta minha esperança. O reencontro me aflige, o medo
me controla, não quero o fim. Amo o recomeço, não importa a rotina, aprecio o início, o desconhecido, o amor amigo.

sábado, 18 de maio de 2013

ETÉREO





                   Sou o supérfluo, o abjeto, o indireto. Incerto e às vezes preciso. 
Confuso, reticente, decidido. Amante, inconformado, descuidado. Apressado, iludido, incompreendido.
                   Acelero os fatos, apresso o acaso, não permito o planejado.
Com o perigo amasiado, sigo na contramão do cuidado.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

ENLACE

           

             Encontrei-o por acaso, na coincidência da vida, rejeitei-o de pronto para aceitá-lo em outro  instante.
             Recusei o seu pedido, seu convite, para abraça-lo depois. O reencontro foi harmônico, a simpatia despertara o interesse. O início de tudo.
              Preciso viver, Externalizar o que sempre ocultei. Não encontro palavras, não consigo o encadeamento lógico.
               Quero reencontrar o homem perfeito, aquele sujeito, que musicou a minha alma, conjugando o sentimento em mim.
             

terça-feira, 30 de abril de 2013

#RECATO.

               





                    Amar é árduo. Difícil hospedar esse sentimento que nos dilacera com tensões,
medos, preocupações, proezas incertezas...
                ...Gentilezas, cuidados, anseios, desvelos e recato. A distância é intensificador, não podemos precisar o epitáfio do amor, podendo gerar saudade ou esquecimento.

sábado, 13 de abril de 2013

ESTAÇÃO







Sinto a força dos anos, respiro novos projetos, transpiro emoções passadas. Não me reconheço, esqueço aborreço.
Não estou no presente, antecipo-me ao futuro e o passado me orienta. Mergulho num voo introspecto, arrependo-me do que não deu certo, sinto a inexatidão, o empuxo da incompreensão.
Emulado pela emoção, envidado pela razão, sou epígono da solidão.

sábado, 23 de março de 2013

RESPIRO




                            
                    Não existo, já não sei o que há em mim, me procuro entre os muitos, os múltiplos, ora sou repleto, ora estou incerto, a euforia do primeiro contato me empolga.
                    Desiludo quando o contato não retorna, não atende, não responde, não compreende...
...minha necessidade de encontrar, minha busca por amar, vontade de compartilhar.
                   Anteontem estive realizado por um momento, o perfil era ideal, mas num instante fatal, o desinteresse formal.
                  Não responde, não atende, não retorna, não explica a razão da ausência;
brincadeira ou desinteresse?

sábado, 16 de março de 2013

ERMITÃO



Minha alma é clara, minha pele escura. Minha moral é rara, meu desejo obscuro.
Minha fé clara, meus anseios obtusos.
Solitário inveterado, incompreendido, rejeitado, ausente,esquecido, coração empedernido.
Envolvido com o abandono,vítima do tormento, fujo de relacionamentos.

segunda-feira, 4 de março de 2013

O 4° poder: A Mídia



Wilson Simonal de Castro nasceu no Rio, em 1939. Ao servir o exército começou a cantar nas festas do regimento. Depois da baixa das forças armadas começou a cantar em shows, principalmente rocks e calipsos, cantados em inglês. Por volta de 1961 foi descoberto pelo produtor e compositor Carlos Imperial e aí começa sua carreira profissional. Em 1963 é lançado pela Odeon o LP “Wilson Simonal tem algo mais”, com arranjos do veterano Lyrio Panicali. Esse disco contava com sucessos da bossa nova como “Telefone” e “Menina flor”. “Amanhecendo”, de Roberto Menescal e Lula Freire, que tinha uma gravação bem sucedida com “Os Cariocas”, recebeu aqui um tratamento suingado, jazzístico, com um resultado impressionante. Não havia dúvidas, estava ali um potencial grande cantor. Comprei agora os CDs para ouvir de novo algo que não ouvia há uns bons 40 anos e confirmei que ainda gosto. Surpreendeu-me a voz jovem do cantor principiante. (Um parêntese, é um saco ser obrigado a comprar uma caixa de 8 CDs, ou como me aconteceu recentemente com Nara Leão, uma caixa de 14 — que não comprei).
O LP seguinte, o segundo da fase bossa nova, foi “A nova dimensão do samba”, de 1964. Arranjos de Panicali e do novato Eumir Deodato. Esse abria com “Nanã”, do genial Moacir Santos. Contava com “Só saudade” e “Inútil paisagem”, de Tom, “Rapaz de bem”, de Johnny Alf, entre outros. Acho que a faixa mais impactante era “Nanã”. Este disco confirmava o grande cantor. Simonal começava a ganhar a fama de melhor cantor da bossa nova, aproveitando-se da reclusão do papa João Gilberto, que raramente cantava. (Eu, que era fanático por João desde o 78 rotações com “Chega de saudade”, de 1958, só cheguei a vê-lo ao vivo lá por 1980.)
O terceiro LP foi “Wilson Simonal”, lançado em março de 65, menos de um ano depois do anterior, fato raro no Brasil. Novamente arranjos de Lyrio Panicali e Deodato. Para mim a faixa impactante foi “Chuva”, de Durval Ferreira e Pedro Camargo. Tinha ainda algumas músicas de Ary Barroso, outras de Carlos Lyra, Tom Jobim, e “Rio do meu amor”, de Billy Blanco, que Simonal defendeu num festival da época. E tinha, para choque dos fãs da bossa nova, uma canção que estava mais para rock do que para MPB, “Juca bobão”. Era o prenúncio da queda.
Deixando de lado tantos detalhes, Simonal gravou algum tempo depois disto uma canção chamada “Mamãe passou açúcar em mim”. A letra dizia mais ou menos assim: “Eu era neném, não tinha talco, mamãe passou açúcar ni mim”. A idéia é que o narrador tinha ficado tão doce que as mulheres, a vida inteira, corriam atrás dele. Um besteirol total, como letra e como melodia. Pois foi essa canção que levou o cantor para a popularidade com o grande público, fazendo com que chegasse a rivalizar com Roberto Carlos na preferência do público. Tinha nascido a pilantragem, nome que ele deu a esse estilo iniciado com “Juca bobão” e consagrado com “Mamãe passou açúcar…”.
Os amantes da música de boa qualidade ficaram chocados com esse barateamento de um talento e se afastaram de Simonal. Mas talentoso ele continuou. Não assisti à famosa cena em que, no Maracanãzinho lotado, ele colocou o público para cantar, em duas vozes, fazendo com que todos cantassem afinados e no tempo certo. Quem assistiu diz que foi impressionante. Mas assisti em 1970, e vi de novo agora em vídeo que está disponível no YouTube, ao dueto dele com Sarah Vaughan, transmitido pela TV Tupi. Em duas canções, “Oh happy days” e “The shadow of your smile”, o jovem cantor de 30 anos dialoga com uma das rainhas do jazz, de 45, de igual para igual, improvisando, variando, e sendo tratado por ela absolutamente como um igual. Novamente, é impressionante.

O crime
De repente Simonal sumiu. Parou de fazer shows, não gravou mais. Aos poucos os fatos se espalharam pelo Rio: Simonal seria dedo-duro do DOPS — o famigerado Departamento da Ordem Política e Social, para onde eram levados os presos políticos. Qualquer músico que tocasse com ele iria para uma lista negra e não tocaria mais. O cantor precisava no mínimo de um pianista, de preferência um baixista e um baterista também. SIMONAL NUNCA MAIS CANTOU. Sobreviveu mais de vinte anos sem poder cantar, até morrer de cirrose causada por alcoolismo. Eu me lembro do diálogo que tive com um amigo que tocava contrabaixo:
“É verdade essa história de dedo-duro?”, perguntei.
“Não tenho a menor idéia”, foi a resposta.
“Mas então por que você não toca com ele?”
“Porque se eu tocar com ele fico proibido de tocar, ninguém mais vai tocar comigo.”
A proibição foi 100% eficaz, e durou até a morte de Simonal.
Não vi esse novo documentário, mas li tudo que achei nos jornais sobre ele. Eis os fatos reais, de acordo com o relato de diferentes pessoas: Simonal achava que seu contador o estava roubando, e contratou dois meganhas para dar uma surra no mesmo. O surrado deu queixa na polícia e o cantor foi processado e condenado — entendo que não foi preso por ser criminoso primário. A história se espalhou e muita gente do meio musical cobrou de Simonal por que ele teria mandado dar a surra.
Acontece que os meganhas contratados por ele eram do DOPS, tinham feito um bico no horário de folga. Simonal, que tinha um lado infantil e mentiroso, passou a espalhar: “Ninguém mexa comigo porque eu tenho amigos no DOPS”. Essa mentira, somada ao fato de que o cantor era visto como favorável ao governo militar, fez com que alguma misteriosa entidade dona da verdade “politicamente correta” decretasse o banimento dele. Ninguém sabe, ninguém viu, quem era essa misteriosa pessoa, ou grupo de pessoas, que teve esse poder monstruoso: decretar a morte profissional de um grande artista. (Não me esqueço de que ele tinha prostituído seu talento, mas ouso pensar que quando essa moda idiota da “pilantragem” se esgotasse algum arranjador de talento o convenceria a gravar música de boa qualidade novamente. Que tal um disco Simonal/Luis Eça?)
Resumindo: um grande artista, aos trinta e poucos anos de idade, foi privado do exercício da sua profissão e de seu talento com base numa mentira sórdida. E o meio musical se acovardou e aceitou isso calado.

sábado, 23 de fevereiro de 2013

DEPRESSÃO


Gira os ponteiros, gira o mundo. O sol declina, ascende, vão-se os dias.
O calendário muda, muda o vestuário, as páginas do diário.
Datas festejadas, confraternizadas, relembradas. Tortura e aprisionamento.
Há três anos tivera uma decepção: flagrara o conjunge com outra em sua própria casa. A separação foi amigável, mas restou o imperdoável. E isso adoecia sua alma.
Aparentemente era saudável, só no seu exterior. A sua vida fora inundada por uma Tsunami de tristeza, embora divorciada, permanecia companheira da depressão. Agatha perdera o prazer pela vida.
Seu corpo tornara-se um invólucro que a aprisionava, a solidão da vida.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

FRUSTAÇÃO



Cansei de esperar, cansei de relegar,  cansei de superar.
Cansei de dizer, cansei de querer; cansei de amar você.
Cansei do desprezo, cansei do desvelo, cansei do desapego. Cansei de sonhar, cansei de acordar, não quero voltar.
Olhar o passado, encarar o presente vê o futuro. Não estou completo, tudo é incerto. Me sinto obtuso. Impossível amar, mudar, acreditar. Expurgado da vida, depositado no ostracismo, sobrevivo à rejeição, o estigma da frustração, revestido de insatisfação.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

SAMUEL RAWET / MOACYR SCLIAR





ANÁLISE DO CONTO ESCALPE DE MOACYR SCLIAR.

Análise comparativa entre os escritores Samuel Rawet e Moacyr Scliar convergem nas obras autoficcionais em que as fronteiras racionais entre vide e obra, se mesclam, compondo um híbrido de ser real e ser imaginado.
Podemos perceber na escrita destes autores a figura do judaísmo e dos judeus que as obras evocam. Essa imagem é formada em duas instâncias diferentes: a voz narrativa pode se identificar como judaica, o que acontece muitas vezes em textos autobiográficos ou autoficcionais, ou essa voz pode criar personagens e atmosferas judaicas nas quais transpire uma visão específica sobre o judaísmo.
Nenhuma das escritas estudadas projeta  exclusivamente uma imagem de judeu clichê, seja tal clichê o construído pela comunidade judaica ou o construído pelo grupo maior. Sendo a voz em primeira ou terceira pessoa, as obras analisadas revelaram diferentes graus de tradução, graus esses indefiníveis, pois fora de uma escala precisa. Vemos judeus desscritos que autofagicamente criam, a partir da representação tradicional do judaísmo, diversas maneiras de ser judeu. Suas escritas demonstram o poder da palavra na projeção de um imaginário de uma cultura que está em trânsito. Para uns, esse trânsito é prejudicial e corrosivo, empobrecedor; para outros, essa ausência de imobilidade é que permite a sobrevivência de um legado em suas diversas traduções. Assim, a escrita foi vista como lugar de livre ação, mas também de inscrição da tradição, da memoria, das quais não se escapa; as historias de um grupo têm uma memória que se perpetua em novas historias.
Em Samuel Rawet, entre o fascínio e o enfado, sua obra projeta a imagem do escritor experimentalista, avesso as questões do consumo, livre de amarras e imposições mercadológicas, disposto a uma escrita que gira em torno de si mesma de maneira alucinante.
Samuel Rawet cria o escritor Samuel Rawet como um artista abusado, corajoso, disposto a encarar a escrita como uma aventura muito séria. Seu manejar labiríntico da língua e sua erudição convivem com o seu sarcasmo, o primeiro dos vários atritos que marcam sua obra.
Com relação ao judaísmo, o autor também se coloca como aquele que se permite o direito de experimentar, independentemente do preço que venha a pagar — no seu caso, um anonimato persistente, que se desfaz atualmente com lentidão, ainda atrelado a grupos de estudos judaicos, e uma perplexidade por parte desse grupo que ele rejeita e ataca com ferocidade. Evidentemente, experimentar talvez seja um eufemismo meu. Contudo, gostaria de marcar que a rejeição progressiva de Rawet aos judeus, ao meu ver, se coloca também como instrumento da escrita, e passo fundamental para a quebra de limites que ele se propõe. O Rawet judeu criado por Rawet é aquele que vive em conflito com a família e a tradição, mas, principalmente, é aquele que rejeita convenções, sejam elas judaicas ou literárias.
Se podemos argumentar que isso se deve a um suposto auto ódio do imigrante que deseja ser um Brasileiro, podemos, da mesma forma, alinhar sua postura como a de um constante desafiador de regras - papel que, como imagem, cai bem, na linha do artista e pensador livre; concretizado texto, todavia, nem sempre o resultado é sedutor.
Em consonância com suas oscilações e contradições, o personagem judeu da ficção de Rawet é, por excelência, o andarilho, o errante, o judeu diaspórico, o imigrante desenraizado em busca de referentes possíveis. Um personagem sofrido, mas também capaz de ser mesquinho - ser judeu, ter sido judeu,  significa ser honrado em particular. Em contraste, Moacyr Scliar é um escritor nascido em berço judaico, o qual fundamenta e produz material para sua literatura. Ser judeu e ser escritor são dois papéis em harmonia, interdependentes. Seja como contador de historias ou contador de si próprio. Scliar projeta uma imagem que é tão pacífica e de bem consigo que julgamos tê-lo decifrado rapidamente. Não há conflitos drásticos a serem expressos, e a escrita revela­-se fluente, acessível, prazerosa. O autor é talvez o que de mais próximo existe do contador de historias Benjaminiano, atuando corno o fio condutor de uma memoria milenar que é respeitada, mas criticada quando necessária. Para o autor, ser considerado um escritor judeu não é uma limitação, pelo contrario: o judaísmo é um dos elementos principais de sua prosa, e a tradução desse para o contexto brasileiro constitui a principal mola propulsora de sua escrita. Sem se ater a rótulos, Scliar é a interseção mais hem acabada entre a cultura judaica e a brasileira. O autor representa o cânone da literatura feita por judeus no Brasil, se assim podemos afirmar,  sua tradução acaba por se tornar, curiosamente, a versão oficial literária do encontro de identidades. Suas obras tornam o elemento estranho, estrangeiro mais próximo e desacralizado, acessível e agradável, o que as configuram como a dialética possível das diferenças e a absorção e ressignificação do choque inicial. Ressignificar a choque é desenvolver a tolerância, conteúdo subjacente de vários de seus livros.
Sobre o conto escolhido, Escalpe, de Moacyr Scliar, não há nada de singular (especial) no conto até o trecho da perseguição do engenheiro a jovem pela floresta, é como se o trecho inicial quisesse tirar a atenção do leitor para verdadeiro foco, quanto ao narrador (onisciente?), não temos certeza dessa onisciência pois, se confunde a fala dos personagens a do narrador, essa narração é feita em 3ª pessoa.
Trecho emblemático: “Ele cortou os cabelos enquanto ainda estava deitado sobre ela”: Ele a teria possuído?
“A peruca fora feita, meses se passaram, uma criança nasceu, um menino”. Associação à peruca ao nascimento da criança dessa mulher que forneceu seu cabelo para confecção dessa peruca (uma narrativa).
Inicio de outra narrativa: “Uma tarde de domingo, o engenheiro descansava em casa, lendo uma revista”. Estava sozinho, a esposa e os filhos passavam a dia fora.
A ambiguidade se estabelece por que o narrador afirma o nascimento de um menino ao tratar sabre à peruca e inicia outra narrativa falando da família do engenheiro e ao tratar das crianças do casal, usa o termo “filhos” e não filhas (se houvesse nascido outra menina da esposa do engenheiro), confirmando que o leitor é quem irá determinar a sua leitura a partir daquilo que lhe é pertinente acreditar (obra aberta).

Em homenagem ao grande escritor Moacyr Scliar que nos deixou no último ano (2012).

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

CONVÍVIO


O passado é meu algoz, professor e herói. Habito o presente, luto contra o tempo, não reconheço a velhice.
Amanheço verões, longa é minha espera; primaveras eternas.
Anelo compreensão, perdão, alguma emoção.
Abomino a razão, ignoro a satisfação, amo a solidão, amiga inseparável, indissociável, a única companhia constantemente inegável.

DESALENTO


Não obedeço às convenções, trilho desencontros, não estou satisfeito, não consigo amar direito.
Não aprecio o coletivo, destoo das tendências, não obedeço ao calendário.
Incongruente e assimétrico busco o método.
Constantemente relegado. Do amor expatriado, enganado pela razão cativo da ilusão, forasteiro da satisfação.
Não compreendo os sentimentos, só nos faz sem alento. Já não espero um grande acontecimento apenas sobrevivo o momento.